BRICS assinam declaração conjunta com foco em inteligência artificial na educação e formalizam Aliança de Cooperação Técnica e Profissional
Ministros da Educação do BRICS firmam compromisso para promover o uso ético da IA, ampliar a cooperação em educação técnica e profissional e reformular as avaliações e qualificações acadêmicas

Por Maiva D’Auria | BRICS Brasil
A promoção ética da Inteligência Artificial (IA) na educação básica e o fortalecimento do ensino técnico e profissional foram dois dos principais compromissos firmados nesta quarta-feira (5) pelos ministros da Educação dos países do BRICS, durante a assinatura de uma declaração conjunta no Palácio Itamaraty, em Brasília.
Na abertura da reunião ministerial, o ministro da Educação, Camilo Santana, destacou que os países do BRICS compartilham desafios semelhantes, especialmente no enfrentamento das desigualdades e na busca por equidade.

“O aspecto que nos une no BRICS são as políticas educacionais — temos importantes desafios pela frente. Não escondemos do mundo que ainda não alcançamos os patamares que almejamos. Outra semelhança que nos une é a diversidade interna do nosso país. Falo pelo Brasil: ainda somos um país com muitas desigualdades. A busca pela equidade é o nosso horizonte.”
Inteligência artificial
A IA foi destaque como um dos pilares principais da presidência brasileira do BRICS em 2025. O embaixador Mauricio Lyrio, designado como sherpa pelo governo brasileiro, explicou que o grupo está promovendo uma discussão sobre a governança global da IA, com o objetivo de estabelecer uma estrutura justa, que assegure a todos os países o acesso e os benefícios proporcionados por essa tecnologia. Ele adiantou que está em negociação uma declaração especial sobre a governança da inteligência artificial, que deverá ser adotada pelos líderes na Cúpula do BRICS, marcada para os dias 6 e 7 de julho.
O Brasil, segundo Lyrio, propôs colocar os temas do desenvolvimento no centro desse debate, ampliando a discussão para além das tradicionais questões de segurança e privacidade, incorporando aspectos como educação e saúde.
“A inteligência artificial que vem transformando nossas vidas de forma tão acelerada, foi naturalmente escolhida como uma das prioridades gerais da nossa presidência. O Brasil está propondo colocar os temas de desenvolvimento no centro de debate sobre IA, indo além de segurança e privacidade”, afirmou o embaixador
Por meio da Declaração, todos os países reconheceram o potencial transformador da IA na reformulação da educação, destacando as oportunidades que essa tecnologia oferece para melhorar os resultados de aprendizagem, personalizar o ensino, reduzir desigualdades e aliviar encargos administrativos. O grupo ressaltou, ainda, que a IA deve ser vista como uma ferramenta complementar ao trabalho dos professores, contribuindo para o aumento da eficiência, mas jamais substituindo o papel essencial dos educadores.
Confira a íntegra da Declaração Conjunta da 12ª Reunião dos Ministros da Educação dos BRICS
Com o documento, os países-membros se comprometeram a fomentar estruturas de governança equitativas, que assegurem o desenvolvimento e o uso responsável, ético e inclusivo da IA na educação básica. Entre as medidas previstas estão a construção de infraestruturas e padrões de dados que promovam a qualidade da educação, bem como o desenvolvimento de mecanismos colaborativos para fortalecer a alfabetização em IA entre professores.

A ministra de Educação Básica da África do Sul, Siviwe Gwarube, reforçou que o foco é garantir que a inteligência artificial seja uma ferramenta para inclusão e não mais um fator que aumente as desigualdades.
"Eu acho que há grandes oportunidades e riscos, obviamente, na inteligência artificial, mas esse é um dos temas que queremos discutir. Podemos realmente usar a IA como uma forma de reduzir a distância entre os que têm mais oportunidades e os que não têm. Usando a tecnologia — e usando-a de forma inteligente, com a ética e respeitando os limites necessários — podemos realmente aproveitá-la para garantir que igualemos as desigualdades em vários países."
Avaliações e qualificações acadêmicas
Mais um pilar importante da Declaração Conjunta é quanto às avaliações no ensino superior e reconhecimento transfronteiriço de qualificações acadêmicas. Embora os países-membros já contem com mecanismos nacionais de avaliação e garantia de qualidade, os ministros destacaram um potencial ainda inexplorado de atuação conjunta no desenvolvimento de princípios comuns e marcos renovados.
Ao defender a superação de métricas estreitas e descontextualizadas, frequentemente baseadas apenas no prestígio, os BRICS propõem o ajuste de indicadores mais sensíveis às realidades sociais, culturais e econômicas de cada país. A meta é fortalecer uma cultura de avaliação que valorize as contribuições reais da pesquisa, do ensino e do engajamento social. Os ministros enfatizam que qualquer avaliação deve considerar a diversidade e as especificidades das instituições em seus respectivos contextos, bem como a necessidade de desenvolver indicadores avançados capazes de medir adequadamente os impactos sociais, econômicos e ambientais da inovação universitária em benefício de sua população.
Aliança de Cooperação Técnica e Profissional
Outro grande marco da reunião ministerial foi a formalização da Aliança de Cooperação em Educação Técnica e Profissional dos BRICS (BRICS-TCA), proposta iniciada na China em 2022 e concluída neste ano.
O objetivo central da Aliança de Cooperação em Educação Técnica e Profissional dos BRICS (BRICS-TCA) é impulsionar a conexão entre o sistema educacional e as competências específicas exigidas pelo mercado de trabalho. A iniciativa busca atuar diretamente sobre as lacunas existentes, promovendo um ambiente educacional mais responsivo e eficaz, capaz de preparar melhor os indivíduos para as demandas profissionais do mercado

Ao enfrentar esses descompassos de competências — quando as qualificações e habilidades dos candidatos não correspondem às necessidades do mercado de trabalho —, a Aliança pretende ampliar as oportunidades individuais e potencializar o desempenho econômico dos países membros. A superação dessas lacunas é considerada primordial, uma vez que pode reduzir os índices de desemprego significativamente e estimular o crescimento econômico dos países do BRICS.
A Aliança pretende fortalecer o intercâmbio de informações e de boas práticas entre os países, visando fomentar benefícios mútuos e uma cooperação de longo prazo no campo da Educação Técnica e Profissional. O acordo deverá, ainda, assegurar a participação equitativa de todos nas atividades de Educação Técnica e Profissional, incluindo mulheres, populações rurais, pessoas com deficiência, migrantes, grupos sub-representados e comunidades locais.
O vice-ministro da Educação da Rússia, Konstantin Mogilevskiy, esclareceu sobre a importância da cooperação do BRICS para promover uma educação mais justa e inclusiva.
“O primeiro passo, que já estamos fazendo, é compartilhar experiências de aprendizado e conhecer as melhores práticas educacionais entre os países. Isso é fundamental. O segundo ponto é discutir os conceitos dos sistemas educacionais de cada país para identificar o que pode ser melhorado. E o terceiro, talvez o mais importante, é garantir que todos os cidadãos tenham o direito de acesso a informações precisas e de qualidade sobre a educação, incluindo a possibilidade de acesso ao ensino superior. Em geral, os países do BRICS são desenvolvidos e participativos nesse processo. Para assegurar a qualidade da educação, não existe um sistema único que funcione para todos, mas utilizamos ferramentas e metodologias desenvolvidas e apoiadas por esses países”, pontuou Mogilevskiy.
Expansão da Universidade em Rede dos BRICS
Outro ponto de destaque foi a assinatura do Protocolo de Adesão da Indonésia ao Memorando de Entendimento sobre o Estabelecimento da Universidade em Rede dos BRICS (BRICS-NU). Com isso, a Indonésia passa a integrar oficialmente a rede de cooperação acadêmica, que busca fortalecer o intercâmbio de estudantes, pesquisadores e instituições de ensino superior entre os países-membros, ampliando as oportunidades de colaboração científica e educacional no agrupamento.
Experiências que inspiram

Armstrong Pame, secretário adjunto do Ministério da Educação da Índia, apresentou alguns projetos do seu país que têm gerado resultados positivos. Entre eles, uma iniciativa direcionada a crianças do ensino básico, que, durante 10 dias, frequentam a escola sem mochilas ou material escolar. Nesse período, elas participam de atividades lúdicas e realizam visitas a locais próximos à escola.
“Pedimos para as crianças fazerem o que gostam, e isso constroi o espírito de equipe e nos permite descobrir os talentos desses alunos”, detalhou. Além disso, para estudantes de 9 a 12 anos, o governo indiano oferece cursos vocacionais e especializados, com foco em áreas como inteligência artificial e computação.
Na área de educação superior, a Índia também tem desenvolvido diversas iniciativas inovadoras. Entre elas, destaca-se a integração das bancas acadêmicas de créditos, permitindo que as experiências profissionais sejam convertidas em créditos acadêmicos válidos nas universidades. Além disso, o país implementou com sucesso a plataforma SWAYAM, que oferece cursos online gratuitos e já conta com mais de 50 milhões de registros, sendo que, apenas em janeiro de 2025, mais de 5 milhões de pessoas se inscreveram. A plataforma possibilita que estudantes realizem disciplinas que não estão disponíveis em sua instituição de origem, com a garantia de que esses créditos serão aceitos pelas respectivas universidades. Para a educação profissional e técnica, foi criada a versão SWAYAM+, que também vem sendo implementada com êxito, ampliando as oportunidades de qualificação.
O ministro Camilo Santana também compartilhou um avanço recente do governo brasileiro. Ele citou, como exemplo desse esforço de articulação, a sanção, em janeiro deste ano, de uma lei que permite aos estados brasileiros trocarem os juros das dívidas com a União por compromissos quantitativos de matrícula de jovens em escolas de tempo integral, com foco na educação profissionalizante. Segundo o ministro, essa medida dialoga com as experiências dos países do BRICS na área de educação profissional de jovens, das quais o Brasil pode — e quer — aprender.
“Temos consciência da potência que a educação profissional significa para o desenvolvimento socioeconômico, para os arranjos produtivos locais, para a inclusão social e para a geração de trabalho decente”, concluiu o ministro.