A Nova Rota do Desenvolvimento: Investimentos Chineses em Ferrovias do Brasil
Mell Mariante • Líder do Marketing na Cosmopolíticos, Graduanda em Relações Internacionais (UEPB)

A Estratégia Chinesa e o Interesse Ferroviário no Brasil
Com dimensões continentais, o Brasil é um país com necessidades de locomoção rápidas, eficientes e com capacidade para grandes volumes e, para isso, malhas ferroviárias são consideradas como as melhores opções. Podendo carregar grandes volumes de carga e alcançando velocidades de até 160km/h, os trens são alternativas ecológicas, econômicas e mais eficientes quando se trata de transportes em massa, sendo, também, uma ótima alternativa para o traslado de pessoas.
As ferrovias são um investimento com alto índice de retorno ao Estado brasileiro, uma vez que sua existência é capaz de aumentar exponencialmente a movimentação de cargas, como é estimado para a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL). Esse projeto, que visa ligar o futuro porto de Ilhéus, no litoral baiano, a Figueirópolis, no Tocantins, prevê 18 milhões de toneladas transportadas por ano no início de sua operação e 50 milhões de toneladas por ano após um período de dez anos. Para além da FIOL, também existem projetos de integração entre países do BRICS que mostram o potencial de investimentos em ferrovias, como o Corredor Internacional de Transporte Norte-Sul (INSTC) e a Ferrovia de Alta Velocidade Moscou-Cazã.
Principais Projetos e Parcerias em Curso
Pensando nas grandes áreas de produção de commodities brasileiras, como soja e milho, o oeste da Bahia e o sul do Tocantins possuem uma ferrovia projetada para o escoamento destes produtos de forma rápida e com gastos menores, tendo o custo de transporte reduzido em 30%, segundo o Plano Nacional de Logística 2035. A FIOL terá em torno de 1700 km e é uma aposta do governo brasileiro para o transporte dessas matérias-primas, podendo futuramente se conectar à Ferrovia Transoceânica.
Decorrente de um investimento chinês de US$50 bilhões, a Transoceânica é uma audaciosa aposta para o futuro, ligando o porto de Chancay, no Peru, aos portos brasileiros da Bahia. A parceria entre Brasil, Peru e China tem como objetivo a integração da América do Sul com o mercado asiático, fortalecendo esta ao encurtar em 10.000 km o trajeto das commodities brasileiras exportadas para a China, com rotas mais diretas sem passar pelo Canal do Panamá.
O investimento chinês no Brasil foi feito através do Fundo Brasil-China de Cooperação Para Expansão da Capacidade Produtiva, o qual tem como intuito o financiamento de projetos de infraestrutura, logística e desenvolvimento sustentável. Esse é mais um da série de investimentos que a China tem feito para fomentar o comércio e o desenvolvimento do Sul Global, sendo, também, um dos objetivos do BRICS. Ao fomentar o comércio e gerar empregos, as ações chinesas para desenvolvimento ferroviário no Brasil visam também objetivos de desenvolvimento sustentável.
Oportunidades Econômicas e Dilemas Geopolíticos
Para além da diminuição dos gastos com transporte das commodities exportadas pelo Brasil, os investimentos ferroviários conseguem fomentar a economia interna brasileira, dado que aumentam a demanda de produção dos produtos exportados, consequentemente gerando mais empregos. A facilidade de locomoção gerada pela malha ferroviária também traz oportunidades para áreas não tão industrialmente desenvolvidas, como Acre e Tocantins, as quais terão a oportunidade de fortalecer sua infraestrutura.
As oportunidades econômicas são diversas, mas podem ir de encontro a alguns dilemas, como o da coordenação trilateral entre Brasil, Russia e Peru dos fundos de investimento e do planejamento inicial da rota de passar pela Floresta Amazônica. A coordenação trilateral do projeto ferroviário exige estudos conjuntos e configurações logísticas que favoreçam todos os envolvidos no projeto, o que pode se tornar um desafio, considerando que cada país possui necessidades diferentes para a ferrovia.
Em meio a todos os impasses, há de se pensar também nas questões ambientais, na medida em que são as mais desafiadoras. Com rotas iniciais que passam por áreas de sensibilidade ecológica, a construção da ferrovia pode ser extremamente nociva a biomas que possuem maior necessidade de preservação. Uma nova rota já foi desenhada, passando pelo Acre e Tocantins, mas que apresenta complicações, pois possui trechos próximos a terras indígenas, o que futuramente pode causar interferências severas na vida daqueles que ali vivem.
Perspectivas para o Desenvolvimento Sustentável e a Integração Regional
Mesmo com desafios, o investimento em ferrovias é algo a se olhar positivamente, em virtude dessas terem o poder de diminuir o valor de transporte do percurso atual entre o Centro-Oeste brasileiro e a China. Cruzando o Oceano Pacifico, essa nova passagem diminuirá também os custos de logística e fortalecerá ainda mais o comércio entre Brasil e China, segundo o Observatório Nacional de Transporte e Logística.
Em conformidade com os objetivos do BRICS, a investida em malhas ferroviárias compreende também o desenvolvimento sustentável, uma vez que trens emitem menos gases poluentes na atmosfera, com diminuições de até 83% em comparação aos transportes rodoviários, além de abarcar maior quantidade por espaço segundo a Agência Nacional de Transporte Ferroviário.
Com tecnologia e expertise, empresas chinesas visam colaborar com o projeto e aumentar a colaboração entre os países, guarnecendo as economias brasileira e chinesa com maiores demandas e mais oportunidades de trabalho. O transporte ferroviário vê-se como uma solução viável, de baixo custo de implementação e manutenção e que possui menor impacto ambiental em comparação com o cenário rodoviário atual.
O investimento ferroviário chama atenção por seus diversos benefícios e por marcar o início de uma parceria estratégica voltada à promoção da cooperação entre países do Sul Global, cujo objetivo comum é o desenvolvimento dos Estados que o compõem, fortalecendo, assim, a influência do bloco no continente. Construindo pontes e interligando regiões, o BRICS possui um papel importante no Sul geopolítico, com o poder de ampliar e firmar o bloco nos holofotes do sistema internacional.
» Referências
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