ARTIGO

BRICS e a transformação da cooperação global diante da emergência climática

Por Gustavo Sousa Soidan • Redator na Cosmopolíticos

A agenda climática do BRICS

O BRICS, formado pelos países mais populosos do planeta e que juntos ocupam cerca de 30% do território global, foi criado em 2006 às margens da Assembleia Geral das Nações Unidas com a proposta de promover, por meio da cooperação, uma transformação nas estruturas clássicas de governança global. O grupo buscava apoiar o avanço dos países em desenvolvimento e oferecer alternativas econômicas aos tradicionais bancos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial.

Com o avanço das negociações internacionais, especialmente após a criação da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e as Conferências das Partes (COP), a cooperação internacional tornou-se central para enfrentar a crise climática. A COP, particularmente, tem sido o principal fórum para a construção de compromissos globais, culminando no Acordo de Paris em 2015, que estabeleceu a cooperação internacional como meio fundamental para frear a emergência climática, definindo responsabilidades compartilhadas por meio das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs).

Nesse cenário, a organização incorporou de forma decisiva pautas climáticas e energéticas em suas discussões, alinhando-se aos compromissos multilaterais e ampliando a cooperação técnica e política. O agrupamento tem compartilhado experiências, tecnologias ambientais e investido em projetos sustentáveis, como energia renovável, acesso à água potável e melhoria das condições de vida em áreas rurais, alinhando-se também às metas e agendas definidas pela Assembleia Ambiental das Nações Unidas (UNEA) e outros organismos multilaterais.

A convergência do multilateralismo climático e os desafios internos do BRICS

O Acordo de Paris, ratificado por quase todos os países, foi um marco para a cooperação climática global, estabelecendo a necessidade de relatórios periódicos e transparência no cumprimento das metas de redução de gases de efeito estufa. Contudo, as NDCs, embora essenciais, ainda representam uma parcela limitada do esforço necessário para conter a mudança do clima.

A recente expansão do BRICS, incluindo países como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irã, amplia a diversidade de agendas e fortalece o grupo. Entretanto, essa ampliação traz desafios, pois esses países mantêm forte dependência econômica dos combustíveis fósseis. Isso exige que o agrupamento formule planos que possam conciliar a mitigação dos impactos ambientais com as realidades econômicas e sociais de seus membros, reconhecendo que a energia fóssil ainda desempenha papel significativo na economia global. A busca por métodos mais eficazes e menos danosos para essa transição deve ser acompanhada de um compromisso coletivo que considere as especificidades nacionais, em consonância com as discussões promovidas pela UNEA e UNFCCC.

Por exemplo, o Irã, que em 2018 tinha cerca de 1% da sua capacidade energética proveniente de renováveis, projeta alcançar 16% até 2030, enquanto a Arábia Saudita espera um crescimento anual composto (CAGR) de aproximadamente 50% em energia solar até 2030, segundo relatórios da Mordor Intelligence. Esses avanços são positivos, mas ainda insuficientes para responder integralmente à crise climática.

A evolução da cooperação internacional e o papel do BRICS

Desde a primeira COP, a cooperação internacional em torno da crise climática evoluiu de compromissos voluntários para um sistema mais robusto de monitoramento, transparência e financiamento climático. Organismos como o Fundo Verde para o Clima (GCF) e a Plataforma Global para a Redução de Riscos de Desastres ampliaram o suporte técnico e financeiro para países em desenvolvimento, incluindo membros do BRICS.

O agrupamento, por sua vez, tem fortalecido sua arquitetura de cooperação, com iniciativas como o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) e o Arranjo Contingente de Reservas (CRA), que apoiam projetos sustentáveis e infraestrutura verde. Além disso, o BRICS investe na Plataforma de Cooperação em Pesquisa Energética (BRICS ERCP), promovendo intercâmbio técnico, desenvolvimento conjunto de tecnologias limpas e estratégias para a transição energética até 2030.

Essa dinâmica reforça o papel crescente da aliança na governança ambiental, contribuindo para um multilateralismo mais inclusivo e eficaz, alinhado às metas da COP e aos objetivos da UNEA, que enfatizam a necessidade de ação coletiva integrada para enfrentar a emergência climática.

Os limites do unilateralismo e a urgência do multilateralismo

As recentes crises internacionais, como os conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio, evidenciam a fragilidade das instituições multilaterais diante de ações unilaterais e interesses hegemônicos. O uso do poder de veto em órgãos como o Conselho de Segurança da ONU dificulta soluções pacíficas e colaborativas, prolongando conflitos e suas consequências humanitárias e ambientais.

No campo ambiental, a cooperação unilateral ou bilateral isolada não é suficiente para enfrentar desafios globais. A crise climática exige uma perspectiva coletiva que considere o interesse comum e a justiça climática. O elevado consumo de combustíveis fósseis pelo setor militar, especialmente dos Estados Unidos, exemplifica como interesses estratégicos podem se sobrepor à urgência ambiental, comprometendo esforços multilaterais.

A chave é o Sul: o protagonismo do BRICS na governança ambiental

Enquanto as superpotências econômicas e militares dominarem o sistema internacional, a agenda ambiental corre o risco de ser marginalizada, reduzida a ações individuais de baixo impacto. O BRICS+, como organização em expansão e com crescente protagonismo, representa uma alternativa promissora para a construção de uma governança ambiental mais justa, inclusiva e sustentável.

O grupo lidera iniciativas inovadoras para a sustentabilidade e a transição energética, promovendo cooperação técnica, financiamento climático e desenvolvimento de tecnologias limpas. Assim, os países que formam o grupo, fortalecem a voz do Sul Global nas negociações internacionais, contribuindo para um sistema multilateral mais equilibrado e efetivo na luta contra a crise climática.

Este cenário mostra que o futuro da governança climática global passa pelo fortalecimento do multilateralismo liderado pelas nações que compõem a aliança, que, ao integrar diversidade econômica e social, pode construir soluções pragmáticas e inclusivas para a emergência climática, alinhadas às demandas do Sul Global e às metas internacionais.

Os artigos de opinião publicados neste espaço são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não refletem a posição oficial da presidência brasileira do BRICS ou do governo brasileiro. As opiniões expressas são independentes e destinam-se a promover o debate plural sobre temas relevantes à agenda do Sul Global.

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