BRICS compartilha soluções para promover a segurança alimentar global
Responsável por 42% da produção mundial de alimentos, os países do BRICS unem forças para combater a fome, enfrentar a crise climática e promover agricultura sustentável. Iniciativas da Índia, Etiópia e Brasil mostram que cooperação e políticas públicas são caminhos para alcançar a soberania alimentar.

Por Inez Helena Soares Mustafa | inez.mustafa@presidencia.gov.br
Os países do BRICS são líderes na promoção da segurança e da soberania alimentar, nutrição e da agricultura sustentável global. Juntos, Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã, são responsáveis por 42% da produção global de alimentos, possuem 33% das terras agrícolas e estão abastecido com 39% dos recursos hídricos do planeta, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar do Brasil.
“Por meio da cooperação, o BRICS está em posição única para enfrentar os desafios agrícolas do século 21, como a segurança alimentar, nutricional, a inflação persistente de alimentos e encontrar soluções inovadoras para enfrentar esses problemas”, disse Thiago Lima, coordenador de cooperação internacional do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, que integra o grupo de trabalho de Agricultura do BRICS.
Em 2023, cerca de 733 milhões de pessoas estavam em situação de fome, de acordo com dados da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura). O estudo avalia que a insegurança alimentar e a má nutrição estão piorando no mundo, por conta da persistente inflação dos preços dos alimentos que continua a corroer os ganhos das pessoas e de diversos setores da economia.
De acordo com Luiz Bedushchi, diretor sênior de políticas da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) que contribiu para os debates do BRICS sobre o tema, para acelerar o ritmo da redução da fome e da pobreza e alcançar a meta de alimentar a todos de forma saudável, é preciso que os países sigam inovando, afirma “Essas inovações acontecem mais rapidamente quando as ideias e as experiências são compartilhadas”, declarou Bedushchi.
Compartilhando Experiências
Os países do BRICS possuem experiência no desenvolvimento de políticas e de programas eficazes para enfrentar desafios agroalimentares. As negociações entre os países membros são espaço para compartilhar experiências exitosas, como a Lei Nacional de Segurança Alimentar (NFSA) da Índia, o Programa Nacional de Colheita de Trigo da Etiópia e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) do Brasil.
Com a implementação da NFSA, a Índia passou de uma nação com déficit alimentar para autossuficiência na produção de alimentos nos últimos 30 anos, segundo as Nações Unidas. “A construção de nossas reservas de alimentos, especialmente as reservas estratégicas, não foi uma jornada da noite para o dia; mas uma longa jornada em que nos tornamos autossuficientes em nossa produção agrícola. Depois, migramos de uma situação de dependência alimentar para uma situação de suficiência alimentar e fomos em direção à segurança alimentar,” afirmou Jail Patil, diretor conjunto do departamento de alimentos e distribuição pública indiano.
A formação de estoques de segurança adequados de grãos alimentícios permite que os indianos não passem por insegurança alimentar em períodos de calamidade nacional, como aconteceu durante a pandemia da Covid-19, de desastres climáticos e de redução da produção agrícola, explicou Patil. “Conseguimos aumentar alguns estoques excedentes sempre que sentimos que há um aumento na taxa global de alimentos. Isso não apenas ajuda a população a lidar com preços da inflação dos alimentos”, conclui o diretor indiano.
Alcançar a soberania alimentar, por meio da modernização da agricultura e da promoção da segurança alimentar, é um dos objetivos prioritários do Plano de Desenvolvimento Decenal da Etiópia (2021-2030). Para aumentar a produção de trigo no país e reduzir a dependência de importações, o governo etíope lançou o Programa Nacional de Colheita de Trigo, contou Leulgesed Abebe, o embaixador do país no Brasil. “Estamos usando o sistema de irrigação nas regiões áridas e semiáridas da Etiópia, o que permitiu que nos tornassemos o maior exportador de trigo da África,” declara o embaixador.

Para o embaixador, o BRICS é tanto um espaço onde a Etiópia pode contribuir para as discussões quanto um ambiente para aprender com as melhores práticas dos países membros. “É nesse ponto que acredito que entra o papel do Brasil, pois o país tem feito um excelente trabalho em reduzir a insegurança alimentar, reduzindo a pobreza e modernizando o seu setor agrícola. O que o Brasil alcançou é uma fonte de inspiração para outros países em desenvolvimento”, salientou Abebe. Ele adiciona que as negociações do grupo permitem a ampliação dos programas agrícolas, tanto bilateralmente quanto dentro do grupo do BRICS.
Em sintonia com o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável 2 (Fome Zero e Agricultura Sustentável), o Brasil retomou múltiplas políticas para nutrição e combate à fome, como o SISAN, e tornou-se uma das nações que mais reduziram a insegurança alimentar entre 2023 e 2024. Uma média de 60 mil pessoas por dia, o suficiente para encher um estádio de futebol, passaram a ter direito a três refeições por dia. Além disso, o Bolsa Família, programa social que fornece auxílio financeiro mensal a famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza, protege mais de 20 milhões de lares brasileiros todo mês.
Mudança do Clima e Agricultura
“A crise climática ameaça, cada vez mais, a capacidade de produção de alimentos, promovendo a insegurança alimentar principalmente nas populações rurais do Sul Global e nas mulheres em todo o mundo”, pontuou Thiago Lima. Além disso, devido à mudança do clima, a inflação do preço dos alimentos tem tornado inacessível esses insumos para os mais pobres e afetado negativamente as condições de vida da classe média, reiterou Lima.

Estima-se que as produções agrícola e pecuária tenham sofrido perdas de 3,8 trilhões de dólares no mundo, devido aos desastres climáticos, nos últimos 30 anos, segundo dados do relatório O Impacto dos Desastres na Agricultura e na Segurança Alimentar também da FAO. Esse total equivale a uma perda média de 123 bilhões de dólares por ano, ou 5% do produto interno bruto agrícola anual, conclui o estudo.
Diante do debate sobre inflação dos alimentos, o Brasil levou ao grupo do BRICS a experiência dentro da Rede de Sistemas Públicos de Abastecimento da América Latina e Caribe. A iniciativa promove a troca de experiências na elaboração e na implementação de políticas públicas para fortalecer uma agricultura resiliente, que leva em conta a produção de alimentos em larga escala e o respeito ao meio ambiente.
Com a catástrofe climática que ocorreu no Rio Grande do Sul, em junho de 2024, a CONAB (Companhia Nacional de Abastecimento) apresentou aos países integrantes da rede a estratégia que utilizou para a compra e a doação de cestas básicas nesse estado. Segundo Marison Marinho, chefe da coordenadoria de relações internacionais da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). As compras emergenciais de cestas básicas permitiu fomentar a segurança alimentar no estado, que estava vivendo uma emergência climática, afirma “Essa rede é uma ação conjunta dos sistemas públicos de abastecimento para promover a erradicação da fome”, enfatizou Marinho.
A cesta básica é um conjunto de alimentos essenciais que compõem a dieta básica de uma família, geralmente calculada para suprir as necessidades nutricionais de um mês. Ela foi criada como uma referência para garantir o mínimo de alimentação adequada e é usada em políticas públicas, cálculos de salário mínimo e programas de assistência social. A cesta básica brasileira varia conforme a região, mas é geralmente composta por: arroz, feijão, óleo de soja, açúcar, café, macarrão, farinha de trigo ou mandioca, leite em pó, pão, carne bovina, ovos, legumes e verduras.