Novo Banco de Desenvolvimento consolida expansão estratégica e reforça compromisso com desenvolvimento sustentável do Sul Global
O NDB, presidido por Dilma Rousseff, reforçou seu papel no desenvolvimento sustentável do Sul Global, anunciando a entrada de Colômbia e Uzbequistão. Com governança igualitária e sem condicionalidades políticas, o banco superou desafios financeiros, captando 16,1 bilhões de dólares em 2024

Por Leandro Molina / BRICS Brasil
Em um momento marcado por transformações na geopolítica econômica mundial, o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB na sigla em inglês), presidido por Dilma Rousseff, reafirmou seu papel como instituição financeira inovadora. Ao final da reunião anual do Banco do BRICS, no Rio de Janeiro, a presidenta Dilma apresentou um panorama dos avanços da instituição, destacando desde a entrada de novos membros até os desafios superados após um período de turbulência financeira, sempre com foco em seu mandato principal: promover o desenvolvimento sustentável e soberano das nações do Sul Global.
A ampliação do quadro de países membros emergiu como um dos pontos centrais da apresentação. Dilma confirmou a aprovação da Colômbia e do Uzbequistão como novos integrantes do banco, decisão tomada pelo Conselho de Governadores — formado pelos ministros da Fazenda dos países participantes do BRICS. Com essas adesões, o NDB passa a contar com 11 membros, incluindo os fundadores originais (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e os incorporados posteriormente (Emirados Árabes Unidos, Bangladesh, Egito e Argélia).
A presidenta do Banco ressaltou que outros países estão em processo de análise para ingresso, mas manteve em sigilo quais seriam essas nações, seguindo diretrizes internas do Conselho que visam preservar a confidencialidade das negociações em andamento. "Nossa expansão seguirá critérios estratégicos, sempre com o objetivo de fortalecer nossa representatividade no Sul Global", explicou Dilma Rousseff, deixando nítido que o banco mantém portas abertas para novas adesões qualificadas.
Foco nas necessidades do Sul Global
A governança do NDB foi outro eixo central da explanação. Dilma diferenciou o modelo adotado pela instituição em relação aos paradigmas tradicionais de organizações como FMI e Banco Mundial. "Nosso banco foi criado pelo Sul Global para o Sul Global, com um sistema de governança baseado na igualdade substantiva entre os membros", enfatizou. Nesse modelo inovador, segundo ela, não há espaço para mecanismos de veto unilateral e todos os países têm voz igual nas decisões estratégicas, que são tomadas por consenso ou maioria qualificada.
Um dos aspectos mais destacados foi a política de não imposição de condicionalidades políticas ou econômicas aos países-membros, marcando uma ruptura com práticas frequentemente criticadas em outras instituições financeiras multilaterais. "Nosso modelo é guiado pela demanda dos países-membros. São eles que definem suas prioridades de desenvolvimento, e nós avaliamos os projetos com base em critérios técnicos, nunca políticos", explicou a presidenta, reforçando o compromisso com o respeito à soberania nacional em todas as operações.
Superação de desafios
O balanço financeiro apresentado por Dilma não escondeu os desafios enfrentados nos últimos anos. Ela fez questão de abordar com transparência o período crítico de 15 meses em que o banco ficou sem realizar captações no mercado internacional — uma situação que colocou em xeque a liquidez da instituição e exigiu medidas enérgicas de recuperação.
Desde que assumiu o comando em março de 2023, Dilma liderou uma vigorosa retomada das emissões de títulos, conseguindo levantar impressionantes 16,1 bilhões de dólares apenas em 2024, com taxas que demonstram a recuperação da confiança do mercado. Entre os exemplos mais notáveis estão os títulos emitidos em renminbi (moeda chinesa) com spreads — diferença entre o preço de compra e o preço de venda — de apenas 0,24% acima da taxa de referência, e as operações em dólar com margens igualmente competitivas, na casa de 0,65% acima do swap rate — indicador do mercado financeiro sobre as expectativas de juros futuros.
"Hoje temos ratings (classificações de crédito) sólidos, incluindo a classificação AAA concedida pela agência japonesa JCR, e estamos ampliando nossos horizontes para novos mercados, como o de ienes e o do Oriente Médio", salientou a presidenta, sinalizando o fortalecimento da posição do NDB no cenário financeiro internacional.
Estratégia de investimentos
A carteira de projetos do NDB atingiu a marca de 40 bilhões de dólares em financiamentos aprovados desde sua criação, distribuídos em 122 iniciativas estratégicas, com 22,4 bilhões de dólares já efetivamente desembolsados. No caso específico do Brasil, os investimentos somam 2,3 bilhões de dólares, abrangendo áreas tão diversas quanto infraestrutura logística, energia limpa e modernização do sistema de saúde.
A estratégia de investimentos segue quatro eixos prioritários que refletem as necessidades mais prementes do desenvolvimento no século 21. A infraestrutura logística recebe atenção especial, com projetos de modernização de portos, aeroportos e ferrovias — incluindo estudos para implantação de trens de alta velocidade — além de iniciativas de integração regional como a ferrovia bioceânica (que ligaria o Brasil ao Peru), ainda em fase de discussão bilateral.
A transformação digital aparece como segundo pilar estratégico, com financiamentos para expansão de redes 5G, preparação para o 6G e construção de data centers que possam garantir a soberania tecnológica dos países membros. No campo da infraestrutura social, os hospitais inteligentes equipados com tecnologias de IA e telemedicina se destacam como projetos emblemáticos, ao lado de iniciativas fundamentais em saneamento básico e habitação popular.
A transição energética completa o quadro de prioridades, com pesados investimentos em energia solar e eólica, sempre acompanhados de soluções inovadoras para o desafio do armazenamento em baterias. "Armazenar vento e sol já foi visto como piada por muitos, mas hoje se revela uma das áreas mais estratégicas do setor energético global", observou Dilma, em referência indireta às críticas que recebeu no passado quando defendia essas tecnologias.
"Armazenar vento e sol já foi visto como piada por muitos, mas hoje se revela uma das áreas mais estratégicas do setor energético global"
— DILMA ROUSSEFF, presidenta do Novo Banco de Desenvolvimento
A estratégia de financiamento em moedas locais mereceu capítulo à parte na apresentação. Dilma Rousseff explicou os riscos que os países emergentes enfrentam quando dependem excessivamente do dólar em seus financiamentos externos. "Um empresário ou governo que contrai empréstimos em moeda estrangeira fica refém de decisões tomadas pelo Federal Reserve ou por outros bancos centrais de países desenvolvidos", alertou.
Como exemplo concreto dessa nova abordagem, ela citou um projeto no Brasil financiado diretamente em renminbi, sem necessidade de conversão para dólar, além de parcerias estratégicas com bancos de desenvolvimento nacionais como BNDES e BRDE para estruturar operações com menor risco cambial. Essa política visa proteger os países-membros da volatilidade das moedas fortes e fortalecer seus mercados de capitais domésticos, criando um ecossistema financeiro mais resiliente e menos dependente dos centros tradicionais de poder financeiro.
A inovação tecnológica emergiu como tema transversal em toda a apresentação. a presidenta foi enfática ao defender que os países emergentes precisam dominar tecnologias críticas como inteligência artificial, biotecnologia e robótica para não se tornarem "meros consumidores passivos do capitalismo de plataformas". O NDB se posiciona como facilitador estratégico nesse processo, promovendo ativamente a transferência de conhecimento entre seus membros.
A expertise chinesa em veículos elétricos e painéis solares, a capacidade indiana em economia digital e a experiência brasileira em biocombustíveis e exploração de petróleo em águas profundas foram citadas como exemplos de competências que podem e devem ser compartilhadas. "Temos um projeto emblemático de hospital inteligente em São Paulo que incorporou conhecimento chinês em sua concepção. Esse é exatamente o tipo de cooperação Sul-Sul que queremos estimular", destacou Dilma, ilustrando como o banco pode funcionar como plataforma de intercâmbio tecnológico entre nações em desenvolvimento.
Perspectivas para o futuro
Ao traçar as perspectivas para os próximos anos, Dilma enumerou quatro eixos prioritários de atuação. A ampliação do quadro de países membros seguirá critérios estratégicos que fortaleçam a representatividade geográfica e econômica do banco. O aumento da mobilização de capital privado ganhará novo impulso com a criação de mecanismos inovadores de garantia que possam reduzir os riscos percebidos pelos investidores.
As parcerias com instituições de pesquisa de excelência serão intensificadas para acelerar o ritmo de inovação tecnológica nos países membros. E o fortalecimento das operações em moedas locais continuará sendo prioridade absoluta, como forma de construir um sistema financeiro internacional mais diversificado e menos sujeito a assimetrias.
Questionada sobre o polêmico tema da "desdolarização", Dilma adotou tom cauteloso e analítico. "Não vejo evidências concretas de um declínio iminente do dólar como principal moeda de reserva global, mas é inegável o crescimento de iniciativas para ampliar o comércio em moedas locais, o que me parece um desenvolvimento positivo", ponderou. Essa posição reflete o pragmatismo que tem caracterizado a gestão do NDB, que busca construir alternativas concretas às vulnerabilidades do sistema financeiro internacional sem adotar posturas meramente contestatórias ou ideológicas.
Criado em 2014 pelos países BRICS como alternativa aos modelos financeiros tradicionais, o NDB tem sua sede em Xangai, na China, e opera com foco no desenvolvimento sustentável e no respeito à soberania nacional. Com os novos anúncios, o plano estratégico traçado, o banco se consolida como ator cada vez mais relevante no cenário financeiro internacional, oferecendo um modelo alternativo que combina solidez técnica com respeito às especificidades dos países em desenvolvimento.